2022

2022: esperança de surpreender positivamente

O ano de 2021 decepcionou, mas o fato é que havia otimismo exagerado de analistas no início do ano.

Muitos cometeram o erro de projetar o desempenho da economia e dos setores baseando-se na rápida recuperação no segundo semestre de 2020, sem reconhecer que fatores transitórios influenciavam bastante o resultado.

É o caso das vigorosas políticas de estímulo e as mudanças de hábitos que beneficiaram particularmente alguns setores, como aqueles associados ao conforto no lar, tecnologia digital e o mercado imobiliário – este último alavancado também pelas taxas de juros excepcionalmente baixas.

O mundo ajudou a fomentar o otimismo de setores exportadores, sendo que a agropecuária foi particularmente beneficiada pela da demanda da China, esta inflada pela combinação de rápido controle da doença naquele país, guerra comercial com Estados Unidos e as consequências da gripe suína africana no embarque de carnes e soja.

Via-se a rápida recuperação do comércio mundial – no formato em “V” – como uma tendência que se estenderia em 2021, principalmente pela perspectiva de vacinação em massa, e o que se tem é sua estagnação nos últimos trimestres.

No início de 2021, alguns chegaram a apostar em um novo superciclo de commodities.

Não que o quadro internacional tenha sido adverso, mas os ganhos foram moderados, e é isso que se espera adiante, com um ciclo econômico mundial mais modesto – retomarei esse assunto em próximo artigo. Além disso, foram ignorados os riscos inflacionários decorrentes das (excessivas) medidas de estímulo.

Os quatro maiores bancos centrais – Fed, BoJ, BCE e BoE – injetaram US$9,1 trilhões na economia em 2020, de acordo com o Atlantic Council Tracker; a cifra equivale a aproximadamente três vezes o realizado em 2008 por conta da crise global.

 

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Isso sem contar as ações pulverizadas dos demais bancos centrais mundo afora.

Somam-se a isso as substantivas políticas fiscais, um elemento praticamente novo no cenário, que trouxe consigo a semente da inflação.

Diferentemente do relaxamento quantitativo, cujo impacto inflacionário depende do aquecimento do crédito – o que não ocorreu –, o impulso fiscal trouxe mais riscos, pois foi em boa medida direcionado a indivíduos.

As magnitudes impressionam: 12,7% do PIB na média dos países avançados e 3,6% nos emergentes (o Brasil destoou, com 8,3%), segundo o FMI.

Adiciona-se a isso o significativo aumento da demanda de alguns bens e serviços específicos, esbarrando em limitações do lado da oferta.

Com os gargalos no suprimento de insumos impostos pela pandemia, estava completa a fórmula para a alta da inflação: o velho conhecido descasamento entre oferta e demanda.

Como se não bastasse, as preocupações com meio ambiente trazem os custos associados à transição energética (inflação verde). Esse quadro deixou consequências para 2022, quando deve prosseguir a desaceleração em muitos países.

A mudança de orientação de política dos BC´s não decorre de o impulso monetário não ser mais necessário, mas da necessidade de combater a inflação. Machuca mais. A má notícia para o Brasil é que já vivemos um quadro praticamente recessivo – ou de estagnação, na melhor das hipóteses –, a julgar pela trajetória de (suave) queda do IBC-Br (medida mensal de PIB do BC).

O país voltou a exibir desempenho pior do que de países parecidos. E é sobre essas condições frágeis que incidirá o aperto monetário do BC.

Além disso, a inflação poderá se mostrar mais resistente do que se imagina, por várias razões: essa é uma característica de inflações elevadas (a inércia é maior), especialmente considerando a indexação de contratos ainda presente; há ainda pressões de custo a se materializarem na indústria e no varejo; e a inflação de serviços tende a acelerar com a maior movimentação de pessoas.

 

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Apesar do viés de piora nas projeções de PIB, IPCA e Selic para 2022 (no boletim Focus estão em +0,3%, 5,0% e 11,75% respectivamente), é improvável se repetir a decepção de 2021.

E esse é um elemento que poderá contribuir para melhorar ou ao menos conter a piora de humor dos agentes econômicos, sendo que já houve importante realinhamento de expectativas no mercado.

Tomando, por exemplo, a performance da bolsa, houve importante correção vis-à-vis a performance dos demais emergentes.

Aqui entra o tema crítico no cenário: eleição presidencial. Fontes de incerteza não faltam, como quem seria o ministro da Fazenda de Bolsonaro ou Lula; o tamanho do compromisso com a disciplina fiscal e as reformas; o espaço para a terceira via; e a capacidade política dos novatos.

No entanto, cabe delimitar alguns riscos:

1) Diferentemente do que se pensa, os investidores costumam dar o benefício da dúvida aos candidatos – só não ocorreu isso em 2002 por conta da surpresa de ter o PT governando, sendo que os candidatos competitivos têm incentivo para fazer discursos responsáveis, principalmente no caminho para o segundo turno, visando a capturar o eleitor do centro.

Para avaliar esse ponto, basta comparar o comportamento dos preços de ativos – o dólar seria a medida ideal – com aquilo que seria o esperado tendo em vista os parâmetros usuais e o quadro global.

Nota-se, pois, que a taxa de câmbio pouco se descolou nas últimas eleições.

2) Na campanha, o tema econômico tende a ganhar destaque junto ao grande público, diferentemente do ocorrido em 2018, quando a corrupção e as questões de costumes se sobressaíram.

O quadro econômico frágil, por sua vez, dificultará a campanha de Bolsonaro, especialmente se a inflação se mantiver elevada (ainda que inferior à de 2021).

Além disso, ele não terá a mesma ajuda do “Posto Ipiranga”, com credibilidade arranhada, e estará vulnerável ao debate eleitoral, tendo sido poupado em 2018.

3) É pouco provável a vitória de Bolsonaro à luz de sua elevada rejeição.

A discussão principal é sobre as chances de ir para o segundo turno.

 

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Sua fraqueza é condição essencial para o crescimento da terceira via – que seria festejada pelos mercados –, até porque desinfla a polarização com Lula.

Esse elemento é ainda mais relevante porque o PT não irá atacar frontalmente Bolsonaro, pois é o adversário ideal.

4) A dispersão de candidaturas da terceira via tende a ser bem menor do que foi em 2018.

O nome principal tende a ser de alguém de centro-direita no espectro político, pois poderá capturar aqueles eleitores que votaram em Bolsonaro e se decepcionaram.

Isso significa que Ciro Gomes ou outros nomes da esquerda parecem ter poucas chances, até por conta da força política de Lula.

5) No provável caminho para o segundo turno, Lula tende a adotar um discurso responsável na economia, distanciando-se dos economistas tradicionais do PT.

Nessa linha, já sinalizou que seu ministro da Fazenda seria um político, em provável alusão à experiência com Palocci no seu primeiro mandato.

Enfim, há espaço para 2022 não decepcionar como 2021, podendo até surpreender positivamente a depender da campanha eleitoral.

Por:

Zeina Latif, Conselheira Solstic | M&A Capital Advisory